segunda-feira, 1 de março de 2010

Travestis e transexuais poderão usar nome social nas escolas públicas de Alagoas

Fonte: 01/03/2010 - 07h00 - Carlos Madeiro Especial para UOL Educação Em Maceió
Travestis e transexuais de Alagoas terão direito a utilizar o nome social nas escolas públicas do Estado. A mudança passa a vigorar, de fato, quando for publicada no Diário Oficial, o que deve acontecer nesta semana.
A medida foi aprovada pelo CEE (Conselho Estadual de Educação) na última terça-feira (23). O pedido foi feito pela ONG Pró-Vida LGBT em janeiro de 2009. Após esse período de análise, os conselheiros decidiram garantir a travestis e transexuais o direito de serem chamadas pelo nome feminino que adotam socialmente -- e não o masculino da certidão de nascimento.
Relatora do processo no CEE, Bárbara Deodora acredita que o respeito à diversidade sexual é um passo crucial para garantir a inclusão dos homossexuais nas escolas. "A homofobia priva os travestis do direito básico à educação e provoca isolamento. Ser reconhecido pelo nome social devolve o direito à cidadania", disse.
Pela decisão, o nome social de travestis e transexuais deve ser inserido nos documentos internos, como cadernetas escolares e provas, com exceção apenas do histórico escolar e do diploma - que devem conter o nome original e uma referência ao nome social. Para solicitar a mudança, basta fazer a solicitação por escrito. No caso de menores de 18 anos, o pedido deve ser feito pelos pais ou responsáveis.
Crescimento da violência
A medida chega em momento de crescimento da violência contra homossexuais no Estado. Segundo um levantamento do Grupo Gay da Bahia, o Alagoas liderou o ranking de assassinatos em janeiro, registrando cinco das 13 mortes do país no primeiro mês de 2010. No ano passado, o Estado registrou 12 crimes, ficando - proporcionalmente - entre os cinco mais violentos do país.Para o diretor da ONG Pró-Vida LGBT, Dino Alves, a mudança aprovada pode ajudar a reduzir as mortes tirando travestis e transexuais da exclusão social. "Por que eles não têm acesso ao mercado de trabalho?
Porque falta qualificação, que depende do ensino básico. Ou seja, [com essa medida] reduz a situação de vulnerabilidade", ressaltou. "Essa decisão é marco histórico. Mas é importante dizer que, enquanto esse projeto tramitava no Conselho, outros estados aprovaram medida semelhante e as colocaram em prática", disse.
Para ele, a decisão demorou "muito". Alves conta que percebeu o problema ao analisar a pouca frequência escolar de travestis e transexuais. "Eu sentia a dificuldade deles nas escolas. Quando era anunciado o nome na chamada, se tornava motivo de gozação. No banheiro, os meninos sempre tinham a história de que os travestis e transexuais iam lá para ficar vendo os pênis deles. Já as meninas inventavam que elas tinham AIDS. Ou seja, um ambiente de preconceito que levava à desistência", explicou.
Preconceito leva à evasãoDepois de muito se esconder, a estudante do segundo ano do ensino médio, Bianca Lima, conseguiu ser chamada pelo nome social na escola Maribondo, na periferia Maceió. Mas, para vencer o preconceito e convencer diretores, professores e colegas, foram necessários diálogo e insistência.
"Tenho 26 anos e não conclui o ensino médio antes por conta do preconceito, das humilhações que passava. Eu acabava desistindo de frenquentar as aulas", conta Bianca. "Agora, consegui, após muita discussão, convencer a me chamarem por Bianca."Ela relembra que, por vários anos, abandonou a escola para fugir da gozação de colegas e até de professores. Curiosamente, o fato que mais lhe marcou veio de um homossexual: "Tive um professor que, apesar de ser gay, não aceitava me chamar pelo nome que adotei. O preconceito existe dos homossexuais também, porque sou um gay que me visto de mulher", disse.
Com a determinação, Bianca diz que vai enfrentar menos preconceito. "Não vou mais precisar ficar convencendo as pessoas na chamada para dizer meu nome social. Será obrigatório. Não vou mais me preocupar em descobrirem meu nome na escola e ficarem fazendo brincadeiras preconceituosas. Com a medida, já penso até em mudar para uma escola mais próxima de casa. Agora vou enfrentar apenas o preconceito fora da escola", afirmou Bianca.